Da invenção da “fronteira” à crise das expectativas ficcionais sobre o desenvolvimento na região amazônica
Resumo
Um dos principais projetos encabeçados pelo regime militar brasileiro foi a colonização da Amazônia, que estimulou a ocupação massiva deste território, mobilizando enormes contingentes de indivíduos das mais diferentes regiões do país. O objetivo deste artigo é compreender os mecanismos discursivos para a produção das migrações para a Amazônia, atentando-se à sua produção e sua materialização nas práticas e significações dos atores sociais. A partir da análise de documentos da Biblioteca Nacional do Exército e de entrevistas com assentados do Projeto de Assentamento Dirigido Rio Juma, no município de Apuí, procedeu-se uma análise documental e qualitativa dos textos e das falas dos interlocutores, apoiando-se na análise e agrupamento temático dos dados, a fim de encontrar significações em comum sobre o território e as migrações para o mesmo. Os resultados demonstram que a colonização esteve apoiada na formação e produção de expectativas individuais a partir do discurso estatal, o qual fundamentou a construção de um “futuro imaginado” sobre a Amazônia como território de ascensão social e econômica. Com efeito, concedeu a esta região um significado que legitimou a formação de um regime institucionalizado de espoliação dos seus recursos naturais.
Palavras-chave
Fronteira. Expectativas Ficcionais. Colonização. Assentamentos.
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