Cadernos CEPEC

A Universidade Pública Frente à Crise Sanitária

José Raimundo Barreto Trindade

Resumo

Por José Raimundo Trindade (Editor)

Chegamos ao volume 9 (1) de 2020 dos Cadernos CEPEC com este número completamos nove anos de publicação, estabelecendo um canal de publicização de trabalhos científicos de qualidade reconhecida e se consolida no meio acadêmico. Segundo a atual avaliação (2016) do sistema Qualis de Periódicos da CAPES (https://goo.gl/mnh5ll) somos B4 nas áreas de Economia e Ciências Ambientais, B5 na Interdisciplinar  e B2 no Planejamento Urbano e Regional/Demografia e B3 no Qualis unificado.

            Este número é dedicado às milhares de vitimas do Covid-19, na Amazônia, Brasil e Mundo. Estamos encerrando um dos mais difíceis semestres da história recente brasileira e mundial. Segundo análise da CEPAL (Comissão Econômica para América Latina) a economia dos países latino-americanos terá o maior declínio do século XX, superior, inclusive ao que se deu durante a crise de 1929 e durante as guerras. No relatório da instituição, ainda de abril deste ano, portanto ainda não consolidada a totalidade das condições criticas da pandemia, alertava que a “crise que a região está sofrendo neste ano de 2020, com queda de -5,3% do PIB será o pior de toda a sua história”, sendo que supera  a “Grande Depressão de 1930 (-5%) ou até mais a 1914 (-4,9%)”.

A pandemia do Covid-19 se alastrou de forma pouco controlada em território nacional, seja pela decisão das autoridades governamentais de fazerem valer o chamado “efeito rebanho”, seja pela incapacidade econômica da maior parte da população de realizar o chamado isolamento social, principalmente a grande quantidade de trabalhadores cuja ocupação encontra-se em regimes informais de trabalho e que se acentuaram nos últimos anos.

Os estudos científicos mostraram que o contágio em massa era uma percepção equivocada e perigosa, gerando como consequência um efeito de projeção da infecção e mortes em grande escala. No caso brasileiro observa-se, a partir da leniência governamental e da incapacidade de realização do isolamento social, um aumento progressivo do número de vitimas. Chegamos no final de junho com mais de 60 mil mortos e mais de 1,5 milhão de contágios.

O capitalismo já vinha passando por um longo processo de reorganização das relações de trabalho. Os movimentos presentes em grande parte do mundo capitalista já se estabeleciam no sentido da elevação do desemprego tecnológico; aumento das jornadas de trabalho; crescente precarização das condições de trabalho e a intensificação da informalidade como dinâmica estrutural do mercado de trabalho brasileiro e mundial.

O movimento mais forte do capitalismo dos últimos anos condiciona a expansão da exploração do trabalho, extraindo valor da força de trabalho, com elevação da produtividade. Este movimento não é uniforme e, tampouco, se dá de maneira idêntica nos diversos países ou mesmo dentro de cada país. No caso brasileiro a expansão do chamado trabalho uberizado, onde uma parcela considerável dos trabalhadores é submetida ao controle não somente da sua força de trabalho normal, mas dos próprios bens físicos dos mesmos (moto, carro, bicicleta), assim como do tempo de descanso, anulando em grande medida a existência social dos trabalhadores que se veem submetidos a uma superexploração do trabalho, estes trabalhadores chegam a trabalhar até 16h por dia para pagar as contas no fim do mês.

A lógica pulsante do capitalismo é a absorção de todas as energias vitais possíveis do trabalhador (a), numa interação entre absolver riqueza liquida produzida por trabalhadores crescentemente explorados e fazer fluir a tecnologia a par de tornar uma parcela gigantesca de homens e mulheres inservíveis aos capitais e invisíveis ao mercado, o que se tornou ainda mais notável nestes tempos de crise pandêmica.

Neste último trimestre, observa-se uma forte aceleração da taxa de desocupação, atingindo no trimestre móvel de março-abril-maio a taxa de 12,9%. Porém, o fator mais grave e revelador da profunda crise referem-se ao nível ocupacional. Pela primeira vez na história brasileira temos mais desocupados do que ocupados. Como mostram os dados da PNAD-C o nível de ocupação em maio alcançou 49,5% da PEA (População Economicamente Ativa), sendo que temos uma crescente quantidade de pessoas fora da força de trabalho, comparando trimestres anuais, como visto abaixo, em março-abril-maio de 2019 a população fora da força de trabalho era da magnitude de aproximadamente 64 milhões de brasileiros, hoje (março-abril-maio de 2020) chega quase a 75 milhões, ou seja, um crescimento de 15,8%, o que se explica parcialmente pelo afastamento social pugnado pela Covid-19, porém está também relacionado a ausência de políticas mais amplas de estimulo ao mercado de trabalho, ao mesmo tempo que reforça a tese da ineficácia das políticas neoliberais de destruição da regulação social (LC 13.467/16 e EC 106/19).

A UFPA assim como outras Universidades Federais atua fortemente no combate a pandemia, mesmo em um quadro, como já assinalado de forte descoordenação nacional. A atuação dos Hospitais Universitários foi fundamental. O registro das ações neste espaço editorial dos Cadernos CEPEC tem o objetivo de fortalecer a capacidade de ação da universidade, mas principalmente observar que a totalidade do ensino público superior, assim como os pesquisadores das diversas áreas, no nosso caso da Economia, está junta na defesa da Universidade pública e da pesquisa voltada aos interesses da população mais atingida pela epidemia. Listamos algumas intervenções:

1)                  Durante a pandemia de COVID-19, o Hospital Universitário João de Barros Barreto (HUJBB), que é referência para casos graves da doença, está disponibilizando o serviço de atendimento telefônico para tirar dúvidas da sociedade paraense sobre o novo coronavírus e oferecer apoio psicológico.

2)                  A Universidade Federal do Pará produziu cartilhas em línguas indígenas para orientar povos originários no combate à COVID-19. A proposta foi desenvolvida por professores e estudantes do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e da Associação dos Povos Indígenas Estudantes da UFPA (APYEUFPA).

3)                  A Universidade Federal do Pará e o Governo do Estado do Pará estabeleceram parceria para que laboratórios da UFPA colaborem com o Laboratório Central do Estado (LACEN-PA) na realização de exames de identificação do coronavírus (Covid-19).

Neste número trazemos seis artigos.

O primeiro artigo dos autores vinculados a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (William E. Nunes Pereira, Ana Cristina dos Santos Morais e Francisco do O´ de Lima Júnior)  tem o objetivo central de analisar pontos relevantes do processo de desenvolvimento desigual no Brasil e, especificamente, o papel da guerra fiscal na redução da desigualdade regional, a hipótese desenvolvida é que a guerra fiscal não contribui para a redução das desigualdades fiscais.

O segundo artigo dos professores Eduardo José Monteiro da Costa e Luiz Alberto de Souza Aranha Machado, busca comparar as contribuições de Celso Furtado, Douglass North e Amartya Sen, notadamente no que se refere ao “estreito vínculo entre cultura e desenvolvimento”.   

No terceiro artigo o professor José Luiz Nunes Fernandes, buscou mensurar o custo transação e de produção na composição dos custos totais dos pontos de vendas de açaí localizados na cidade de Belém, a pesquisa chegou à conclusão que cada litro do vinho de açaí produzido em um ponto de venda tem o custo unitário de R$ 4,57 para uma produção diária de 100 litros.

O quarto artigo intitulado “Bases, conceitos e noções acerca do metabolismo econômico-social-ecológico”, de autoria de Tiago Soares Barcelos, Pedro Luiz Teixeira Camargo e Loyslene Freitas Mota, nos trás uma importante contribuição sobre os rumos do metabolismo econômico-social-ecológico, concluindo que “o crescimento infinito proposto pelos economistas convencionais é simplesmente utópico, não existindo essa possibilidade”.

O quinto artigo versa sobre os impactos dos royalties nas finanças e desenvolvimento dos municípios, os autores tratam especialmente do município amazonense de Coari no período de 1991 a 2014. Para isso os autores (Fábio Heleno Mourão da Costa e Marília Carvalho Brasil) apresentam os fundamentos econômicos (mainstrean e marxista) que geram a renda do setor petrolífero; bem como tratam metodologicamente a arrecadação dessa compensação, a fim de analisar a aplicação dos royalties em setores sociais e a relação destes gastos com o crescimento econômico e dinamismo da região.

Por fim, no sexto artigo, Artur Beker, investigar os critérios de repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e quais os níveis de equalização fiscais obtidos por estes comparando os impactos dos recursos do mesmo nos orçamentos dos municípios de Pará e Minas Gerais no ano de 2017.

Vale aqui considerar as preocupações de todos os pesquisadores e pesquisadoras quanto aos atuais rumos estabelecidos pelo Governo Federal quanto ao Sistema de Pesquisa e Educacional brasileiro. As Universidades Federais constituem importante instrumento da sociedade brasileira para construção de políticas de desenvolvimento, inovação tecnológica e formação de pessoal de alto nível.

            Boa leitura e ensejamos que divulguem a produção publicada nos Cadernos CEPEC, inclusive em suas redes sociais.


 


Palavras-chave

Universidade Pública, UFPA, Editorial


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DOI: http://dx.doi.org/10.18542/cepec.v9i1.8929

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